Ideias Incríveis!

Ideias Incríveis!

Translate

12 de abr. de 2012

O Tamanco Acusador

                 

Devemos saber que em tempos idos, existiram costumes muito lindos e louváveis, dos quais hoje não sobrou nenhum. Por em muita conta este fato, é isto o que eu, com uma curta narrativa, quero mostrar.
Morava na cidade de Jurupoca um homem de nome Orlando. Tal pessoa era casada, tinha um corpo ainda bonito, apesar da idade, e era um grande cortejador de mulheres. Sucedeu que, dentre outras senhoras Jurupoquenses, uma lhe agradou. Tal mulher, ainda jovem, vistosa e bela, expressavasse muito bem. 

Numa certa noite, aconteceu que Orlando foi jantar com a tal mulher. Encontraram-se ainda muitas vezes, com imenso prazer para os dois, sempre dentro da mais discreta ordem e do mais rigoroso sigilo.
Mas certo dia, numa tarde de sábado, a esposa de Orlando e a sogra combinaram de fazer compras na cidade vizinha. E ele não podendo dizer-lhes não, respondeu que faria aquilo que lhe pediram, com prazer.
Entraram no carro, e deixaram Jurupoca. O tempo estava lindo e propício a um passeio. Orlando pôs-se a pensar enquanto dirigia, em sua amante. Era uma pena estar a sogra e a mulher com ele, pois não podia meditar mais a vontade. E assim foi a viagem em direção a Jurupaca. 



Então, de repente, um cavalo cortou a estrada, espantando os agradáveis pensamentos de Orlando com o susto. Ele brecou o carro, automaticamente, sem mesmo saber ao certo o que estava acontecendo. A velha sogra estava no banco traseiro, bem à  vontade, e havia tirado os tamancos para refrescar os pés. Com a parada brusca, o tamanco da mulher deslizou sob o banco, indo parar próximo aos pés de Orlando.
O homem, quando notou o tamanco, ficou atemorizado, e veio-lhe ao pensamento de que era o tamanco da amante, que talvez até ali o tivesse deixado propositalmente. Transtornado, seu coração parecia chegar à  boca. O que faria? O que faria? Mas que má sorte, pensava. Aquilo era a prova da sua desonestidade... bem ali perto dos seus pés .

Oh, não teriam piedade do seu infortúnio! Precisava pensar em algo, e rápido. Olhava ora para frente, ora para trás, ora para os lados, ora para baixo... e ali via o tamanco. Acusador! O que fazer com ele era o que pensava Orlando, em silencioso desespero.
Então, subitamente, uma idéia lhe veio, e olhando pela janela do lado da esposa, gritou: Oh ! Oh! OhOhOh!!!!
 




A mulher e a sogra olharam para o lado, acompanhando o olhar de Orlando. Foi o momento de que ele precisava. Pegou o tamanco rapidamente e o jogou pela janela.
A mulher, que não viu nada, quis saber porque Orlando gritara e ele: porque me pareceu ver um objeto estranho no céu. Vocês não viram? 

A mulher nem se deu ao trabalho de responder, já que não havia visto nada. Orlando, ainda amedrontado, nem podia fazer idéia de onde conseguira aquela saída. Mas, apesar de tremulo, estava aliviado. Continuando a viagem, Orlando apreciou tanto a sua esperteza para o problema, que todo o seu medo transmudou-se em alegria e riso. 
Fitou a esposa, considerou-a lindíssima, reconheceu suas excelentes maneiras e até teve a impressão de que tudo era mais bonito, como se visse pela primeira vez. O peso da consciência fazia-o ver tudo de maneira diferente. Ouviu música, cantou e riu junto com a sogra e a mulher. 
Pouco depois chegaram à  vizinha Jurupaca. O marido agora mais zeloso do que nunca, ajudou a mulher a descer do carro e em seguida foi ajudar a sogra, que nesse momento começou a procurar o tamanco, pois só achara um pé. E é claro que ela jamais acharia o outro... Orlando, compreendendo o que acontecera, começou a sentir-se uma besta. Não era o tamanco da amante que ele havia jogado janela à  fora, mas sim o tamanco da sogra! Que grande tolo! Havia pensado que estava em uma armadilha e que tinha sido muito esperto. Foi apenas idiota, pensou consigo mesmo. 
Mas procurando não ficar perturbado, disse o zeloso marido à sua mulher: Mas como a sua mãe pode vir apenas com um tamanco no pé?
Não veio não! - Gritou a esposa - Se você estivesse presente teria visto ela colocar os dois.
E Orlando, continuando seu teatro particular, exigiu que a esposa explicasse como podia ter sumido apenas um pé do tamanco então. 

Eu não sou cega! Vi minha mâe com os dois pés calçados!
E Orlando, na maior cara de pau:  Não acho que esteja cega, mas acho vocês mulheres um pouco desmemoriadas.
 Arrependa-se do que falou, Orlando! Não permito que faça pouco de minha mãe e de mim! Volte a ser o homem que era à  pouco! Exigiu a mulher, acreditando na repentina solicitude do marido. 
E o agora gentil Orlando não teve dúvidas. Com um sorriso cínico, viu que já havia conseguido mudar a situação a seu favor. Estava tranquilo. E sem dizer mais palavras, saiu com imenso prazer para comprar um par de tamancos para sua querida sogra...

Nenhum comentário:

Postar um comentário